sábado, 26 de fevereiro de 2011

Xenofobia afeta imigrantes na Europa


Em Portugal, estudo aponta que grupos minoritários compostos de negros e imigrantes foram vítimas de racismo e de discriminação


Por Cinthia Meibach

Dados da Organização Mundial de Imigrações apontam que nem a crise econômica que afetou a Grécia no começo deste ano e se estendeu à Irlanda, ameaçando também países como Portugal, Espanha e Itália, impediu que imigrantes chegassem ao continente Europeu em busca de uma vida melhor. De acordo com o órgão, nunca o planeta contou com tantas pessoas vivendo fora dos países de origem como no ano de 2010. Dos 214 milhões de imigrantes, um terço vive na Europa.

Porém, diante do desemprego recorde que atinge o continente, afetando cerca de 23 milhões de pessoas, muitos países recorrem a medidas de expulsão de estrangeiros e de criação de barreiras contra a entrada de mais imigrantes, o que faz despertar nos europeus sentimentos de intolerância e de xenofobia – termo utilizado para se referir a qualquer forma de preconceito, racial, grupal ou cultural.

Na Suíça, no último dia 28 de novembro, foi aprovado um projeto de lei que prevê a expulsão automática de estrangeiros condenados por crimes, sem levar em consideração a gravidade dos delitos. A proposta do projeto partiu de um dos maiores partidos políticos da Suíça, a União do Centro Democrático (UCD), que é conhecido por incentivar a xenofobia por meio de cartazes e mensagens contra os imigrantes.

Embora a lei portuguesa garanta a todos os cidadãos residentes no país dignidade e oportunidades idênticas, visando eliminar o racismo e a xenofobia, um estudo realizado pelo Centro de Investigações e Ciências Sociais e Humanas Númena, publicado em Portugal no ano de 2008, apontou que grupos minoritários compostos de negros e imigrantes, no contato com diversas instituições portuguesas, foram vítimas de racismo e de discriminação.

A professora de história Kátia Souza (foto ao lado), de 30 anos, garante que se soubesse que seria vítima de tanto preconceito por ser brasileira não teria deixado o Brasil e ido a Portugal fazer o curso de mestrado. Há 2 meses no país, ela se diz indignada pela forma como tem sido tratada pelos portugueses. “Sabia que sofreria preconceito na Europa, mas nunca pensei que ficaria sem poder alugar uma casa, mesmo tendo condições para pagá-la”, desabafa.

Kátia conta que por quase 1 mês andou na capital, Lisboa, à procura de moradia e, por diversas vezes, foi vítima de preconceito por parte dos portugueses, que se recusaram a alugar casa para ela, afirmando que não faziam negócios com brasileiros e nem com negros. “O mais traumatizante para mim foi quando, na minha busca, me hospedei com meu marido e minha filha de 2 anos em um hotel no centro de Lisboa e no terceiro dia de estada a funcionária percebeu que eu era brasileira e exigiu o pagamento do restante das diárias antecipado. Como se não bastasse, solicitou nossos documentos de forma grosseira, desconfiando que estivéssemos ilegalmente no país. Foi uma situação muito constrangedora, que eu não desejo para ninguém”, desabafa.

A jornalista portuguesa Carla Vaz, de 32 anos, garante que o que mais se ouve nas ruas de Portugal são justificativas dos portugueses para tamanho preconceito. “A imagem do brasileiro aqui é de pessoas barulhentas, que só arrumam confusões. Já as brasileiras são vistas como mulheres que vêm para tomar o marido das portuguesas e conseguir a dupla cidadania. Embora eu não concorde com esses pensamentos, não posso negar que são eles que predominam em grande parte da população portuguesa”, declara.

Para o antropólogo Mércio Pereira Gomes, autor do livro “O índio na história”, o preconceito português contra imigrantes, e em especial aos brasileiros, pode se justificar pelas razões históricas que ligam os dois países, ressaltando a relação de colonizador e de colonizado. “ O fato é que Portugal tem uma folha corrida de discriminação a brasileiros, desde a época dos dentistas, em fins da década de 1980. Agora, com seu declínio econômico, depois da bonança da ajuda da Comunidade Europeia, a situação tende a piorar. A xenofobia é uma das potencialidades humanas mais execráveis. A sociedade tem que estar atenta para manifestações xenófobas e racistas ”, afirma.

Já para Alexandre Ciconello, advogado e assessor de Direitos Humanos e Políticas Públicas do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a xenofobia não é um sentimento de propriedade de Portugal, mas de toda a Europa, pois muitos europeus sentem que estão perdendo espaço de trabalho para os imigrantes, e essa indignação cresce, tornando-se em ódio. “A xenofobia é resultado de uma junção de desinformação, desigualdade e preconceito histórico”, ressalta.

Ele ainda alerta para os perigos que o sentimento pode acarretar e enfatiza a importância de se cultivar a tolerância, o respeito e a busca pelo cumprimento da declaração dos Direitos Humanos: “A gente tem que construir a nossa sociedade baseada na tolerância, respeito às diferenças e combate ao preconceito. Vale lembrar que as nações que não respeitaram isso, geraram guerras, como, por exemplo, o nazismo e os conflitos ainda existentes no Oriente Médio. Aqueles que se sentirem vítimas desse sentimento devem ir atrás dos seus direitos, fazendo cumprir a Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada por 192 países do mundo, que garante que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, aconselha.

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